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professora jessica
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MOACIR GADOTTI
Escola cidadã
Estudo do livro “Escola cidadã”.
POLÊMICAS DO NOSSO TEMPO.
Moacir Gadotti
Abel Rodrigues de Bessas Júnior
educador
2009
Capítulo I
AUTONOMIA E NATUREZA
DA EDUCAÇÃO
Por que discutir hoje a autonomia da escola?
Porque discutir a autonomia da escola é discuti a própria natureza da educação.
A escola que está perdendo a sua autonomia também está perdendo a sua capacidade de educar para a liberdade. É a tese que pretendo defender. Discutir o tema da autonomia é discutir a própria história da educação, na medida em que podemos ver a história da educação, na medida em que podemos ver a história da luta pela autonomia intelectual e institucional da escola, associada à liberdade de expressão e de ensino. Embora não seja sempre o termo utilizado com freqüência, o seu conteúdo essencial encontra-se em toda história do pensamento pedagógico.
O debate atual da autonomia escolar enraíza-se no processo dialógico de ensinar dos primórdios da filosofia grega. No diálogo entre Sócrates e Menón acerca da questão “se a virtude podia ser ensinada”, numa praça de Atenas, o mestre Socrates insiste que o escravo Menón deve procurar, nele mesmo, a resposta. Educar significa, então capacitar, potencializar, para que o educando seja capaz de buscar a resposta do que pergunta, significa formar para a autonomia. A escola, no ideal de Sócrates, deveria instituir-se toda ela em torno da autonomia. Seu método: o diálogo. O discípulo é quem deve descobrir a verdade. Portanto, a educação é auto-educação.
A palavra “autonomia” vem do grego e significa capacidade de autodeterminar-se, de auto-realizar-se, de “autos” (si mesmo) e “nomos” (leis). Autonomia significa autoconstrução, autogoverno. A escola autônoma seria aquela que se autogoverna. Mas não existe uma autonomia absoluta. Ela sempre está condicionada pelas circunstâncias, portanto a autonomia será sempre relativa e determinada historicamente.
Podemos dizer que o educador humanista italiano Vittorino da Feltre (1378-1446) é um precursor da moderna escola anti-autoritária. Em sua escola chamada “La Casa Giocosa” (A Casa Alegre), numa época em que predominavam os métodos autoritários da escolástica, centrados no mestre, Da Feltre propunha métodos ativos com a participação direta dos alunos. Da mesma forma, as críticas satíricas de François Rabelais (1495-1553), aos métodos escolásticos, contribuíram para o desenvolvimento das idéias de “autogoverno” na pedagogia, idéias que influenciaram Montaigne (1533-1592), John Locke (1632-1778). Para Montaigne o problema da educação se situa no interesse do aluno pelos estudos que seria tanto maior quanto maior fosse a sua participação na escolha dos conteúdos.
O humanista Tcheco Jean Amos Comenius (1592-1671), como outros educadores modernos, enfatizava a importância da ação e da auto-atividade do aluno. Em Locke encontramos pela primeira vez na história do pensamento pedagógico a expressão “autogoverno” (self-goverunent de Locke tinha um sentido moral, de autodomínio. Já em Rousseau, a expressão “autogoverno” tem um sentido social-educativo. A pedagogia de Rousscau centra-se na autonomia da criança: a criança é um ser completo e perfeito como o adulto, dizia ele.
A Escola Nova se forma como novo paradigma educativo e encontra em John Dewey (1859-1952) seu expoente máximo, cujos princípios do “aprender fazendo”, “aprender pela vida” e “para a democracia” permanecem vivos até hoje. Além de Dewey, as obras de Maria Montessori (1870-1952), Pistrak, Jean Piaget (1896-1980) e Célestin Freinet, (1896-1966) consagraram os princípios da autonomia e auto-atividade do educando. Mas há perspectivas diferentes entre eles. A obra de Pistrak, por exemplo, insistia mais na auto-organização dos alunos, colocando a gestão das atividades educativas como um meio educativo fundamental.
Adolph Ferrière (1879-1960), grande mestre da Escola Nova, e Jean Piaget dedicaram diversos estudos ao tema da autonomia dos estudantes e da escola. Em L’autonomie des écoliers dans les communautés d’enfants, Adolph Ferrière, depois de um longo estudo das comunidades de crianças e adolescentes e de apresentar vários exemplos de escolas públicas que praticam o chamado self-government, conclui afirmando que “a vida social, bem como a moral, o sentido do bem e do mal na vida coletiva, não podem ser aprendidos a não ser na prática” (FERRIÈRE, 1950:143). Daí o papel importante da autonomia (self-government) no processo de “socialização” gradual das crianças: “a autonomia é uma preparação para a vida do cidadão, tanto melhor, quanto mais substituem nela o exercício concreto e a experiência da vida cívica à lição teórica e verbal”, afirma Piaget em seu livro pouco conhecido La autonomia en la escuela (PIAGER, 1950:26). Piaget adverte que a autonomia pode tanto formar para a “democracia parlamentarista” quanto para a “subordinação aos chefes”.
O tema da autonomia teve um papel crítico e mobilizador contra o poder instituído verticalmente, burocraticamente. Ao centralismo opunha-se uma prática social baseada na participação.
O movimento anti-autoritário na educação não é recente. Segundo Jesus Palácios a oposição às relações e métodos autoritários “tem por eixo central a exaltação da liberdade da criança e do grupo no qual a criança está integrada” (PALÁCIOS, 1984:14). A idéia de autonomia está sempre associada à idéia de liberdade. O movimento anti-autoritário na educação inaugura a diferença entre a Escola Tradicional (centrada no mestre) e a Escola Nova (centrada no aluno). Um dos mais importantes pedagogos anti-autoritários é o educador espanhol Francisco Ferrer Guardia (1859-1909), fundador da “Escola moderna”, racionalista e libertária. Outro educador, o inglês Alexander S. Neill (1883-1973), com sua experiência da escola livre de Summerhill toda a organização da escola era controlada pelos alunos. Segundo Neill, para que o autogoverno fosse possível, o professor deveria renunciar a toda forma de autoridade, a toda pretensão hierárquica, a todo tipo de dirigismo. Por outro lado, o terapeuta norte-americano Carl R. Rogers (1902-1987) transpôs para o ensino centrado no aluno deveria basear-se na empatia, na autenticidade, confiança nas potencialidades do ser humano, na pertinência do assunto a ser aprendido, na aprendizagem participativa, na totalidade da pessoa, na auto-avaliação e na autocrítica.
Foi a Escola Nova que levantou mais alto a bandeira da autonomia na escola, entendento-a como livre organização dos estudantes, autogoverno. Muitas experiências pedagógicas foram feitas nesse sentido, e a literatura existente sobre esse assunto é abundante. Todavia, o movimento da Escola Nova, que introduziu os métodos ativos e livres na educação enfatizou mais a autonomia como fator de desenvolvimento pessoal do que como fator de mudança social. Ela tem o mérito, porém, de evidenciar como a autonomia e o autogoverno fazem parte da própria natureza da educação. Como diz Olivier Reboul, “a autoridade é, sem dúvida, necessária para impedir a criança de prejudicar e de prejudicar-se; mas a educação não começa senão no momento em que cessa a autocoerção” (REBOLUL, 1974:52).
É a partir da Segunda metade desse século, com as críticas à educação como fator de reprodução social, que o tema da autonomia foi associado a uma concepção emancipadora da educação. Esse já é o capítulo da autogestão.
Escola cidadã
Estudo do livro “Escola cidadã”.
POLÊMICAS DO NOSSO TEMPO.
Moacir Gadotti
Abel Rodrigues de Bessas Júnior
educador
2009
Capítulo I
AUTONOMIA E NATUREZA
DA EDUCAÇÃO
Por que discutir hoje a autonomia da escola?
Porque discutir a autonomia da escola é discuti a própria natureza da educação.
A escola que está perdendo a sua autonomia também está perdendo a sua capacidade de educar para a liberdade. É a tese que pretendo defender. Discutir o tema da autonomia é discutir a própria história da educação, na medida em que podemos ver a história da educação, na medida em que podemos ver a história da luta pela autonomia intelectual e institucional da escola, associada à liberdade de expressão e de ensino. Embora não seja sempre o termo utilizado com freqüência, o seu conteúdo essencial encontra-se em toda história do pensamento pedagógico.
O debate atual da autonomia escolar enraíza-se no processo dialógico de ensinar dos primórdios da filosofia grega. No diálogo entre Sócrates e Menón acerca da questão “se a virtude podia ser ensinada”, numa praça de Atenas, o mestre Socrates insiste que o escravo Menón deve procurar, nele mesmo, a resposta. Educar significa, então capacitar, potencializar, para que o educando seja capaz de buscar a resposta do que pergunta, significa formar para a autonomia. A escola, no ideal de Sócrates, deveria instituir-se toda ela em torno da autonomia. Seu método: o diálogo. O discípulo é quem deve descobrir a verdade. Portanto, a educação é auto-educação.
A palavra “autonomia” vem do grego e significa capacidade de autodeterminar-se, de auto-realizar-se, de “autos” (si mesmo) e “nomos” (leis). Autonomia significa autoconstrução, autogoverno. A escola autônoma seria aquela que se autogoverna. Mas não existe uma autonomia absoluta. Ela sempre está condicionada pelas circunstâncias, portanto a autonomia será sempre relativa e determinada historicamente.
Podemos dizer que o educador humanista italiano Vittorino da Feltre (1378-1446) é um precursor da moderna escola anti-autoritária. Em sua escola chamada “La Casa Giocosa” (A Casa Alegre), numa época em que predominavam os métodos autoritários da escolástica, centrados no mestre, Da Feltre propunha métodos ativos com a participação direta dos alunos. Da mesma forma, as críticas satíricas de François Rabelais (1495-1553), aos métodos escolásticos, contribuíram para o desenvolvimento das idéias de “autogoverno” na pedagogia, idéias que influenciaram Montaigne (1533-1592), John Locke (1632-1778). Para Montaigne o problema da educação se situa no interesse do aluno pelos estudos que seria tanto maior quanto maior fosse a sua participação na escolha dos conteúdos.
O humanista Tcheco Jean Amos Comenius (1592-1671), como outros educadores modernos, enfatizava a importância da ação e da auto-atividade do aluno. Em Locke encontramos pela primeira vez na história do pensamento pedagógico a expressão “autogoverno” (self-goverunent de Locke tinha um sentido moral, de autodomínio. Já em Rousseau, a expressão “autogoverno” tem um sentido social-educativo. A pedagogia de Rousscau centra-se na autonomia da criança: a criança é um ser completo e perfeito como o adulto, dizia ele.
A Escola Nova se forma como novo paradigma educativo e encontra em John Dewey (1859-1952) seu expoente máximo, cujos princípios do “aprender fazendo”, “aprender pela vida” e “para a democracia” permanecem vivos até hoje. Além de Dewey, as obras de Maria Montessori (1870-1952), Pistrak, Jean Piaget (1896-1980) e Célestin Freinet, (1896-1966) consagraram os princípios da autonomia e auto-atividade do educando. Mas há perspectivas diferentes entre eles. A obra de Pistrak, por exemplo, insistia mais na auto-organização dos alunos, colocando a gestão das atividades educativas como um meio educativo fundamental.
Adolph Ferrière (1879-1960), grande mestre da Escola Nova, e Jean Piaget dedicaram diversos estudos ao tema da autonomia dos estudantes e da escola. Em L’autonomie des écoliers dans les communautés d’enfants, Adolph Ferrière, depois de um longo estudo das comunidades de crianças e adolescentes e de apresentar vários exemplos de escolas públicas que praticam o chamado self-government, conclui afirmando que “a vida social, bem como a moral, o sentido do bem e do mal na vida coletiva, não podem ser aprendidos a não ser na prática” (FERRIÈRE, 1950:143). Daí o papel importante da autonomia (self-government) no processo de “socialização” gradual das crianças: “a autonomia é uma preparação para a vida do cidadão, tanto melhor, quanto mais substituem nela o exercício concreto e a experiência da vida cívica à lição teórica e verbal”, afirma Piaget em seu livro pouco conhecido La autonomia en la escuela (PIAGER, 1950:26). Piaget adverte que a autonomia pode tanto formar para a “democracia parlamentarista” quanto para a “subordinação aos chefes”.
O tema da autonomia teve um papel crítico e mobilizador contra o poder instituído verticalmente, burocraticamente. Ao centralismo opunha-se uma prática social baseada na participação.
O movimento anti-autoritário na educação não é recente. Segundo Jesus Palácios a oposição às relações e métodos autoritários “tem por eixo central a exaltação da liberdade da criança e do grupo no qual a criança está integrada” (PALÁCIOS, 1984:14). A idéia de autonomia está sempre associada à idéia de liberdade. O movimento anti-autoritário na educação inaugura a diferença entre a Escola Tradicional (centrada no mestre) e a Escola Nova (centrada no aluno). Um dos mais importantes pedagogos anti-autoritários é o educador espanhol Francisco Ferrer Guardia (1859-1909), fundador da “Escola moderna”, racionalista e libertária. Outro educador, o inglês Alexander S. Neill (1883-1973), com sua experiência da escola livre de Summerhill toda a organização da escola era controlada pelos alunos. Segundo Neill, para que o autogoverno fosse possível, o professor deveria renunciar a toda forma de autoridade, a toda pretensão hierárquica, a todo tipo de dirigismo. Por outro lado, o terapeuta norte-americano Carl R. Rogers (1902-1987) transpôs para o ensino centrado no aluno deveria basear-se na empatia, na autenticidade, confiança nas potencialidades do ser humano, na pertinência do assunto a ser aprendido, na aprendizagem participativa, na totalidade da pessoa, na auto-avaliação e na autocrítica.
Foi a Escola Nova que levantou mais alto a bandeira da autonomia na escola, entendento-a como livre organização dos estudantes, autogoverno. Muitas experiências pedagógicas foram feitas nesse sentido, e a literatura existente sobre esse assunto é abundante. Todavia, o movimento da Escola Nova, que introduziu os métodos ativos e livres na educação enfatizou mais a autonomia como fator de desenvolvimento pessoal do que como fator de mudança social. Ela tem o mérito, porém, de evidenciar como a autonomia e o autogoverno fazem parte da própria natureza da educação. Como diz Olivier Reboul, “a autoridade é, sem dúvida, necessária para impedir a criança de prejudicar e de prejudicar-se; mas a educação não começa senão no momento em que cessa a autocoerção” (REBOLUL, 1974:52).
É a partir da Segunda metade desse século, com as críticas à educação como fator de reprodução social, que o tema da autonomia foi associado a uma concepção emancipadora da educação. Esse já é o capítulo da autogestão.
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